segunda-feira, 9 de maio de 2011

SOCIEDADE: A doença do consumo desenfreado

João Alexandre Peschanski

Da Redação do Brasil de Fato


A sociedade contemporânea está doente. Homens e mulheres, descontroladamente, são levados a comprar, sem necessidade. Fazem do consumo uma opção de lazer e uma forma de libertação. Os shopping centers se tornaram os templos dessa sociedade - doente - de consumo. Reivindicam o espaço público, mas não passam de comunidades fechadas e restritas, onde se mantém a dominação do rico sobre o pobre. A análise é da socióloga Valquíria Padilha, que acaba de lançar o livro Shopping center: a catedral das mercadorias (Boitempo Editorial, 2006), resultado de sua pesquisa de doutorado. Em entrevista ao Brasil de Fato, por correio eletrônico, Valquíria contou que se dedicou a estudar o papel dos centros comerciais no lazer dos brasileiros. Sua conclusão estarrece: o shopping center cria um novo tipo de sociabilidade, mas uma sociabilidade destrutiva. Tanto para o ambiente, quanto para o cidadão. É a manifestação de uma sociedade doente, cuja cura só se dá sob uma transformação radical.


Brasil de Fato - Por que os shopping centers assumem tanta importância na vida das pessoas, a ponto de ser considerados indispensáveis para algumas delas?


Valquíria Padilha - A importância desse templo do consumo vem crescendo, nos últimos 40 anos. O shopping center integra o projeto capitalista estadunidense chamado de american way of life, que espalha pelos quatro cantos do mundo o estilo de vida nos Estados Unidos. O cinema foi e ainda é o principal veículo para disseminar esse conceito, acompanhado do shopping center, do fast food e do automóvel. Sem se dar conta, as pessoas vão assimilando a "cultura" estadunidense e a necessidade de integrar a chamada sociedade de consumo. O shopping center ganhou espaço nas sociedades capitalistas porque passou a signifi car uma nova cidade, mais limpa, segura, moderna, organizada e mais seletiva que a cidade real, aquela realidade que eu denomino de "mundo de fora".


BF - Qual o impacto dos shopping centers na definição do espaço público e da cidadania?


Valquíria - Como nas últimas décadas as cidades e os espaços públicos entraram em um processo de declínio, acentuado com a implementação de políticas neoliberais, a noção de coletividade e de direitos sociais sofreu transformações. Com o desenvolvimento da sociedade de consumo, os sujeitos políticos - aqueles que têm deveres mas também têm direitos - foram praticamente engolidos pelos sujeitos consumidores - aqueles que vivem para produzir e gastar o salário, consumindo muito mais do que realmente precisariam para sobreviver. O shopping center, essa cidade artificial criada estrategicamente para incitar os desejos de compra, é um lugar privado travestido de público. Portanto, é uma comunidade sem política, uma comunidade sem governo, sem democracia, sem discussão de assuntos que interessam à coletividade. Não acredito no consumo como um ato coletivo, por mais que consumir tenha um significado social na medida em que demarca status e diferenciação entre as pessoas. Não acho possível falar em consumidor cidadão. Cidadania exige espaço público, que não existe no shopping center.


BF - No caso brasileiro, fala-se em dois níveis de cidadania: dos ricos, que podem tudo, e dos pobres, que são uma espécie de subcidadãos.


Valquíria - No Brasil e nos países onde a desigualdade social é mais visível, a violência urbana aparece como um complexo fenômeno que acentua a degradação do espaço público e empurra as camadas privilegiadas da população para lugares mais "protegidos", como o shopping center ou, para os mais endinheirados, a loja Daslu, em São Paulo. A cidadania e a democracia partem do princípio de que todos têm os mesmos direitos na vida em sociedade. Mas, na prática, os que têm mais dinheiro acabam tendo mais direitos que outros. A cultura do consumo nasce e se estabelece sobre os ideais da liberdade individual de escolha, o que gera uma equação complicada do ponto de vista da política e da cidadania, uma vez que a liberdade de escolha é maior, no capitalismo, para quem tem mais dinheiro. Então, quanto mais se acentua a liberdade individual do consumidor, mais a vida pública se debilita.

Um comentário:

  1. Atenção 2º ano!
    Leiam a entrevista e façam um pequeno relatório sobre Sociedade de consumo.

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