segunda-feira, 9 de maio de 2011

SOCIEDADE: A doença do consumo desenfreado

João Alexandre Peschanski

Da Redação do Brasil de Fato


A sociedade contemporânea está doente. Homens e mulheres, descontroladamente, são levados a comprar, sem necessidade. Fazem do consumo uma opção de lazer e uma forma de libertação. Os shopping centers se tornaram os templos dessa sociedade - doente - de consumo. Reivindicam o espaço público, mas não passam de comunidades fechadas e restritas, onde se mantém a dominação do rico sobre o pobre. A análise é da socióloga Valquíria Padilha, que acaba de lançar o livro Shopping center: a catedral das mercadorias (Boitempo Editorial, 2006), resultado de sua pesquisa de doutorado. Em entrevista ao Brasil de Fato, por correio eletrônico, Valquíria contou que se dedicou a estudar o papel dos centros comerciais no lazer dos brasileiros. Sua conclusão estarrece: o shopping center cria um novo tipo de sociabilidade, mas uma sociabilidade destrutiva. Tanto para o ambiente, quanto para o cidadão. É a manifestação de uma sociedade doente, cuja cura só se dá sob uma transformação radical.


Brasil de Fato - Por que os shopping centers assumem tanta importância na vida das pessoas, a ponto de ser considerados indispensáveis para algumas delas?


Valquíria Padilha - A importância desse templo do consumo vem crescendo, nos últimos 40 anos. O shopping center integra o projeto capitalista estadunidense chamado de american way of life, que espalha pelos quatro cantos do mundo o estilo de vida nos Estados Unidos. O cinema foi e ainda é o principal veículo para disseminar esse conceito, acompanhado do shopping center, do fast food e do automóvel. Sem se dar conta, as pessoas vão assimilando a "cultura" estadunidense e a necessidade de integrar a chamada sociedade de consumo. O shopping center ganhou espaço nas sociedades capitalistas porque passou a signifi car uma nova cidade, mais limpa, segura, moderna, organizada e mais seletiva que a cidade real, aquela realidade que eu denomino de "mundo de fora".


BF - Qual o impacto dos shopping centers na definição do espaço público e da cidadania?


Valquíria - Como nas últimas décadas as cidades e os espaços públicos entraram em um processo de declínio, acentuado com a implementação de políticas neoliberais, a noção de coletividade e de direitos sociais sofreu transformações. Com o desenvolvimento da sociedade de consumo, os sujeitos políticos - aqueles que têm deveres mas também têm direitos - foram praticamente engolidos pelos sujeitos consumidores - aqueles que vivem para produzir e gastar o salário, consumindo muito mais do que realmente precisariam para sobreviver. O shopping center, essa cidade artificial criada estrategicamente para incitar os desejos de compra, é um lugar privado travestido de público. Portanto, é uma comunidade sem política, uma comunidade sem governo, sem democracia, sem discussão de assuntos que interessam à coletividade. Não acredito no consumo como um ato coletivo, por mais que consumir tenha um significado social na medida em que demarca status e diferenciação entre as pessoas. Não acho possível falar em consumidor cidadão. Cidadania exige espaço público, que não existe no shopping center.


BF - No caso brasileiro, fala-se em dois níveis de cidadania: dos ricos, que podem tudo, e dos pobres, que são uma espécie de subcidadãos.


Valquíria - No Brasil e nos países onde a desigualdade social é mais visível, a violência urbana aparece como um complexo fenômeno que acentua a degradação do espaço público e empurra as camadas privilegiadas da população para lugares mais "protegidos", como o shopping center ou, para os mais endinheirados, a loja Daslu, em São Paulo. A cidadania e a democracia partem do princípio de que todos têm os mesmos direitos na vida em sociedade. Mas, na prática, os que têm mais dinheiro acabam tendo mais direitos que outros. A cultura do consumo nasce e se estabelece sobre os ideais da liberdade individual de escolha, o que gera uma equação complicada do ponto de vista da política e da cidadania, uma vez que a liberdade de escolha é maior, no capitalismo, para quem tem mais dinheiro. Então, quanto mais se acentua a liberdade individual do consumidor, mais a vida pública se debilita.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Violência e criminalidade - abordagem histórico-social em criminologia
Roldenyr Cravo - Três Rios(RJ) - 16/01/2009
Desde que a sociedade foi formada, (qualquer que seja o entendimento: do ponto de vista bíblico, por Adão e Eva; do ponto de vista sociológico-científico, pela evolução do ser humano), viver em sociedade quer dizer conviver com outros indivíduos; as mais das vezes, indivíduos bem diferentes de nós: cor, sexo, etnia, idade, gostos, manias, hábitos, desejos, pretensões, etc. Portanto, para que esta convivência pudesse ser mantida, tornou-se necessário à criação de regras; regras sociais; que na realidade são padrões de comportamento. Um comportamento será socialmente aceitável, sempre que estiver de acordo com estas regras sociais. Serão inaceitáveis aqueles comportamentos que não estiverem em desacordo com as regras sociais. O comportamento socialmente inaceitável também é chamado de desvio social.
Há, desde então, um grande esforço da sociedade para estabelecer um disciplinamento, um controle sobre estes comportamentos desviantes. Este esforço gerou a criação do que se chama CONTROLE SOCIAL, que nada mais é do que um conjunto de mecanismos materiais e simbólicos para manter o equilíbrio social, para reduzir os comportamentos desviantes, individuais ou coletivos.
O controle social pode ser exercido formalmente, ou seja, pelas instituições públicas (Polícia, Justiça, Política, Administração Pública, etc), como também, informalmente, ou seja, por instituições privadas (Associações, clubes de serviço, ONGs, Família, Igreja, Escola, etc).
A figura da VIOLÊNCIA aparece exatamente neste contexto de desacerto ou desequilíbrio da vida social. É uma palavra que tem origem do Latim, na palavra "vis", que quer dizer força -força empregada no sentido destrutivo, diminutivo, de causar um dano, uma diminuição no patrimônio de alguém (patrimônio físico ou subjetivo).
Há muito tempo os estudiosos se dedicam a estudar este fenômeno e procuram dar uma definição precisa para ele. Muitas dessas definições não são precisas porque, ou misturam com outras coisas, ou deixam de explicar outras situações. Um sociólogo Norueguês, nascido em OSLO em 1930, chamado JOHAM GALTUNG, (doutor em matemática e sociologia; professor de Estudos para a Paz e Teoria dos Conflitos nas universidades do Havaí e Witten/Herdecke, Tronsoe e na Universidade Européia da Paz; autor do primeiro manual das Nações Unidas do programa Transformação de Conflitos por Meios Pacíficos), há alguns anos, definiu VIOLÊNCIA, como toda situação ou conjuntura onde um indivíduo sofre pressões que o impedem de desenvolver plenamente suas potencialidades. Esta definição permitiu trabalhar com categorias precisas e separar a violência de outros fenômenos, como é o caso da CRIMINALIDADE. VIOLÊNCIA é um fenômeno histórico-social, inerente a vida em sociedade; pode estar presente em todas as práticas sociais. CRIMINALIDADE é um fenômeno jurídico; é tudo que diz respeito ao crime e ao criminoso, sendo a CRIMINOLOGIA a ciência que estuda este fenômeno. VIOLÊNCIA é continente e CRIMINALIDADE é conteúdo. Pode existir violência sem criminalidade; mas a criminalidade é uma forma de violência.
Entendemos, a partir daí, que as várias dimensões onde a violência se manifesta. Pode ocorrer na dimensão ECONÔMICO-SOCIAL, ou seja, tudo que diz respeito a esfera econômico-social do indivíduo: emprego, salário, moradia, transporte, segurança, estudo, qualidade de vida, saúde; tudo que diz respeito a vida do indivíduo relacionada a esses aspectos. Pode ocorrer na dimensão SIMBÓLICA, isto é, se manifestar no plano psíquico, das idéias, do afeto, dos valores, das relações. Pode ocorrer na dimensão CORPORAL, ou seja, se manifestar no plano físico, do corpo, compreendidos aí, a maioria do que se conhece como crimes (lesão corporal, homicídio, injúria, calúnia, estelionato, roubo, furto, extorsão, corrupção, etc).
Alguns estudos detectaram a existência de 2 fatores de produção de violência: fator estrutural e fator ético-político. Como fator estrutural, são considerados fatores de produção de violência as desigualdades sociais, a degradação das condições de vida, a concentração de terras e riquezas, e etc. Como fator ético-político, são considerados fatores de produção de violência, a crise das instituições formais de poder do Estado (poderes legislativo, executivo, judiciário), a manutenção de privilégios de classes sociais, a crise dos valores republicanos (respeito à lei), a crise dos valores democráticos (igualdade, liberdade, fraternidade e dignidade), bem como, as formas capitalistas empresariais de atuação de grupos criminosos (traficantes, milícias, corporações fraudulentas, etc.).
Muitos já tentaram explicar a violência, e muitas das vezes, não raramente, quando falam de violência, na verdade estão se referindo à criminalidade, ou vice-versa. Reclamam medidas que são de efeito somente sobre a criminalidade, e com isso, a violência continua, podendo gerar mais criminalidade; aí fica parecendo que as medidas não surtiram efeito, ou não foram suficientes, acabando por aumentar mais ainda a sensação de insegurança, medo, incompetência e impotência. Dentre os maiores equívocos estão opiniões como as que afirmam que as causas da violência são de natureza econômico-sociais (apenas). Tudo que diz respeito ao econômico-social está ligado diretamente às classes sociais. Na maioria das vezes, atribui-se às classes sociais menos favorecidas como os responsáveis pela violência. Alguns argumentos são até tentadores, como os que apontam a favelização, a política de emprego, etc. Esses discursos reclamam medidas contra o que no entender deles é a "violência", sempre divididas em 2 formas: mais repressão (exército nas ruas, pena de morte, etc); leis mais severas (aumento de pena, redução da menoridade penal, etc). Aqui vamos nos deparar com as contradições do sistema. Uma sociedade recém saída de anos de ditadura e opressão, pede por mais repressão.
Uma sociedade onde o processo legiferante, (direito é só aquele que é previsto na lei), é feito pelos representantes políticos eleitos, compromissados com as chamadas classes sociais dominantes, ou os grandes grupos econômicos. Portanto, este processo privilegia as classes sociais dominantes em detrimento das classes pobres ou subalternas, (cuja representatividade política é mínima). Novamente aqui vamos nos deparar com outra contradição: Direito x direitos; Estado x excluídos; é a violência estrutural; ela permeia, agride, sufoca, até que a cidade engula a Cidade (favelização).
Neste contexto, o argumento que entende que a causa da violência é econômico-social, cai diante de fatos recentes, já observados há alguns anos, onde filhos de famílias de classe média estão cada vez mais cometendo crimes, a tal ponto, que a revista Veja publicou recentemente uma matéria de capa entitulada "ricos, bonitos e criminosos".
Mesmo assim a polícia insiste na pirotecnia estrategicamente hipócrita do "enxuga gelo"; e por mais "me-engana-que-eu-gosto" que seja, ela garante votos (obrigatórios pra alguns, comprados de outros e pagos por beneficiados...), até que se casse seu autor e se envergonhe os duzentos anos de existência de uma instituição.
A violência não é um fenômeno novo. No contexto da virada do século 19 para o século 20 já havia um contexto de desequilíbrio social. Os acontecimentos mais importantes daquele período foram abolição da escravidão e a proclamação da República. Com a abolição da escravidão, uma massa de ex-escravos, se juntou a uma massa de homens-livres-pobres, formando um contingente de indivíduos sem qualquer perspectiva. Houve o aumento de delitos, mendicância, prostituição, etc. O controle social de então era situado na unidade de produção, isto é, a fazenda, exercido pelo senhor de engenho auxiliado pelos capatazes e capitães-do-mato. Com a proclamação da república, este controle foi deslocado para o Estado, recém criado. Suas instituições não foram suficientes ou competentes para dar conta do controle. Do Estado Republicano, ou seja, do Estado burguês até o aparecimento do capitalismo, também se verifica um contexto de esgotamento das estratégias tradicionais de controle social, expressos em frases muito comuns tais como "bandido é problema de polícia", revelando um total descompromisso e alienação da sociedade. Atualmente, na virada do século 20 para o século 21, o contexto histórico é muito semelhante àquele da virada do século 19 para o século 20. Um absoluto esgotamento das estratégias formais de controle social.
Para alguns especialistas, a grande prova do esgotamento das estratégias tradicionais de controle social nos nossos dias está em que, antes de falharem a polícia ou a justiça, falharam primeiro a família, a escola e a igreja. Isto porque, segundo este entendimento, o primeiro controle sobre o indivíduo, é feito na família. Os pais deveriam controlar seus filhos, e com isto, através da educação, fazer com que não se envolvessem em crimes ou com criminosos. Juntamente com a família, atuam a igreja e a escola, que seriam responsáveis pela instrução e preparação para a vida útil. Entendem ainda que, a não distinção entre o que seja violência e o que seja criminalidade, ajuda é mais um elemento complicador para o encaminhamento de eventuais propostas de soluções, mostrando que quando a sociedade fala sobre estes temas, dá mostras de que sabe, mas não conhece, por isso, confunde, mistura.
A questão que se propõe é como propiciar a cidade para todos. Como fazer com que a sociedade tenha uma postura pró-ativa e assuma suas responsabilidades como elemento indispensável ao controle social. Como fazer com que as instituições formais de controle social, (polícia, políticos, justiça, empresários e mídia), assumam perfis mais voltados para o coletivo do que para o individual, onde se propicie uma economia com distribuição de renda minimamente justa, onde se assegure o acesso ao crescimento intelectual, físico, econômico-social para todos.
Analisando sob uma perspectiva histórico-social, podemos agora dizer que ela, a violência, não é um fenômeno novo. No contexto da virada do século 19 para o século 20 já havia um contexto de desequilíbrio social. Os acontecimentos mais importantes daquele período foram abolição da escravidão e a proclamação da República. Com a abolição da escravidão, uma massa de ex-escravos, se juntou a uma massa de homens-livres-pobres, formando um contingente de indivíduos sem qualquer perspectiva. Houve o aumento de delitos, mendicância, prostituição, etc. O controle social de então era situado na unidade de produção, isto é, a fazenda, exercido pelo senhor de engenho auxiliado pelos capatazes e capitães-do-mato. Com a proclamação da república, este controle foi deslocado para o Estado, recém criado. Suas instituições não foram suficientes ou competentes para dar conta do controle. Do Estado Republicano, ou seja, do Estado burguês até o aparecimento do capitalismo, também se verifica um contexto de esgotamento das estratégias tradicionais de controle social, expressos em frases muito comuns tais como "bandido é problema de polícia", revelando um total descompromisso e alienação da sociedade. Atualmente, na virada do século 20 para o século 21, o contexto histórico é muito semelhante àquele da virada do século 19 para o século 20. Um absoluto esgotamento das estratégias formais de controle social.
Para alguns especialistas, a grande prova do esgotamento das estratégias tradicionais de controle social nos nossos dias está em que, antes de falharem a polícia ou a justiça, falharam primeiro a família, a escola e a igreja. Isto porque, segundo este entendimento, o primeiro controle sobre o indivíduo, é feito na família. Os pais deveriam controlar seus filhos, e com isto, através da educação, fazer com que não se envolvessem em crimes ou com criminosos. Juntamente com a família, atuam a igreja e a escola, que seriam responsáveis pela instrução e preparação para a vida útil. Entendem ainda que, a falta de entendimento sobre o que é a violência e o que é a criminalidade, é mais um elemento complicador para o encaminhamento de eventuais propostas de soluções.
É necessário propiciar a cidade com cidadania para todos. A partir deste ponto de vista, é necessário que a sociedade e as instituições informais de controle social (Família, Escola, Igrejas, ONGs, Sindicatos, Associações, Comunidades, entidades organizadas, etc), tenham uma postura pró-ativa (e não apenas a crítica exacerbada, negativista, sofrista e fatalista), e assumirem de uma vez por todas os seus "papeis", (Durkheim), as suas culpas e as suas responsabilidades como elementos indispensáveis ao controle social. As instituições formais de controle social (órgãos de governo, poderes da república, polícia, políticos, justiça, empresários e mídia), deveriam ter um agir normatizado com ênfase para o coletivo do que para o individual. Governos deveriam estabelecer programas que propiciassem uma distribuição de espaço físico e renda minimamente justos, onde se assegurasse o acesso ao crescimento intelectual, físico, econômico-social para todos. A Segurança Pública não deveria ser um mero programa de governo, mas sim assunto de Estado, apartidária e suprapartidária, de maneira tal que seja conferido aos órgãos que a operam a independência necessária e aparelhados com instrumental jurídico, econômico, técnico e científico moderno e eficiente para se obter um desempenho realisticamente efetivo.
Finalmente, é necessário que Governos, políticos e sociedade entendam a verdadeira dimensão da violência e da criminalidade como fenômenos distintos que são, e que, portanto, Segurança Pública não é somente (e apenas) um mero "problema de polícia", mas é uma questão político-social (deve ser enfrentada pela sociedade e suas instituições), e que, portanto, os problemas só poderão ser encaminhados a partir de ações globais dentro de um rigoroso planejamento geo-político e sócio-econômico, levando em consideração as peculiaridades do contexto histórico atual, de modo que enfrentamentos e repressão (que são ações necessárias, emergenciais, mas, pouco duradouras), NÃO SEJAM as únicas respostas para estas questões.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Ideologia

O que é ideologia?- Maria Lúcia Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins

O que é ideologia?
Ideologia: sentido amplo
Há vários sentidos para a palavra ideologia. Em sentido amplo, é o conjunto de idéias, concepções ou opiniões sobre algum ponto sujeito a discussão. Quando perguntamos qual é a ideologia de determinado pensador, estamos nos referindo à doutrina, ao corpo sistemático de idéias e ao seu posicionamento interpretativo diante de certos fatos. E nesse sentido que falamos em ideologia liberal ou ideologia marxista.
Ainda podemos nos referir à ideologia enquanto teoria, no sentido de organização sistemática dos conhecimentos destinados a orientar a ação efetiva. Existe portanto a ideologia de uma escola, que orienta a prática pedagógica; a ideologia religiosa, que dá regras de conduta aos fiéis; a ideologia de um partido político, que estabelece determinada concepção de poder e fornece diretrizes de ação a seus filiados. Já ouvimos a expressão "atestado ideológico", que é a declaração exigida sobre a filiação partidária de alguém. No Brasil, durante o recrudescimento do poder autoritário, órgãos como o Deops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social) exigiam em certas circunstâncias que as pessoas apresentassem atestados desse tipo, a fim de controlar a adesão às ideologias marxistas, consideradas perigosas à segurança nacional.
Ideologia: sentido restrito
O conceito de ideologia tem outros sentidos mais específicos, elaborados por autores como Destutt de Tracy, Comte, Durkheim, Weber, Manheim. Mas é sobretudo com Marx que a explicitação do conceito enriqueceu o debate em tomo do assunto e de sua aplicação. Para ele, diante da tentativa humana de explicar a realidade e dar regras de ação, é preciso considerar também as formas de conhecimento ilusório que Levam ao masscaramento dos conflitos sociais. Segundo a concepção marxista, a ideologia adquire um sentido negativo, como instrumento de dominação.
Isso significa que a ideologia tem influência marcante nos jogos do poder e na manutenção dos privilégios que plasmam a maneira de pensar e de agir dos indivíduos na sociedade. A ideologia seria de tal forma insidiosa que até aqueles em nome de quem ela é exercida não lhe perceberiam o caráter ilusório.
A concepção de Gramsci
Vale considerar um reparo feito pelo marxista italiano Gramsci (1891-1937), para quem é preciso distinguir entre ideologias historicamente orgânicas e ideologias arbitrárias. As primeiras são historicamente necessárias porque "organizam as massas humanas, formam o terreno sobre o qual os homens se movimentam, adquirem consciência de sua posição, lutam etc.". Segundo Gramsci, pode-se dar ao conceito de ideologia "o significado mais alto de uma concepção de mundo que se manifesta implicitamente
na arte, no direito, na atividade econômica, em todas as manifestações de vida individuais e coletivas" e que tem por função conservar a unidade de todo o bloco social.
Portanto, Gramsci considera que em um primeiro momento, enquanto concepção de mundo, a ideologia tem a função positiva de atuar como cimento da estrutura social. Quando incorporada ao que chamamos senso cotnum, ela ajudará a estabelecer o consenso, o que em última análise confere hegemonia a uma determinada classe, que passará a ser dominante.
Evitando a concepção mecanicista, Gramsci não considera que os dominados permaneçam submissos indefinidamente, pois no senso comum poderão ser trabalhados elementos de bom senso e de instinto de classe que aos poucos formarão por sua vez a ideologia dos dominados. Daí a necessidade da formação de intelectuais surgidos da própria classe subalterna e capazes de organizar coerentemente a concepção de mundo dos dominados.

In: FILOSOFANDO, INTRODUÇÃO À FILOSOFIA. ARANHA, M. L. A e MARTINS, M. H. P. São Paulo: Moderna, 1993, 2.ed.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Caros alunos!

Não se esqueçam a prova de sociologia está marcada para o dia 28 de abril! Bons estudos!!!

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Aspectos teóricos da industria cultural e a televisão no Brasil

Aspectos teóricos de la industria cultural y la televisión en Brasil

Theoretical aspects of the cultural industry and television in Brazil




Dtdo. Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação Física da Unicamp.

Programa Estágio Docente da FEF-Unicamp.

(Brasil)


Marco Antonio Bettine de Almeida

marcobettine@gmail.com







Resumo

Este texto busca analisar algumas características da Industria Cultural, apontando as questões fundamentais para pensar esta categoria a partir do referencial da teoria crítica. Posteriormente, discutiu-se a consolidação do projeto capitalista de industrialização da cultura através da televisão como expressão máxima da reprodutibilidade técnica, ideologia e fetichismo.

Unitermos: Industria cultural. Ideologia. Televisão.



Resumen

Este texto busca examinar algunas características de la industria cultural, con indicación de las cuestiones clave para pensar sobre esta categoría a partir del marco referencial de la teoría crítica. Además, se debate la consolidación del proyecto capitalista de la industrialización de la cultura a través de la televisión, como expresión máxima de la reproducibilidad técnica, la ideología y el fetichismo.

Palabras clave: Industria cultural. Ideología. Televisión.



Abstract

This text search examines some features of the Cultural Industry, indicating key issues to think this category from the reference of critical theory. Later, discussed is the consolidation of the capitalist project of industrialization of culture through television as an expression of maximum reproducibility technique, ideology and fetichism.

Keywords: Cultural industry. Ideology. Television.

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 121 - Junio de 2008

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Introdução

Relendo alguns estudos sobre a crítica da industria cultural percebi que apesar do pensamento pessimista da teoria crítica, ela, como projeto de análise do real, ainda oferece categorias interessantes para analisar a realidade material.

A questão da Internet, a explosão de imagens que somos expostos, o uso da racionalidade instrumental para convencer as pessoas a consumirem os produtos, os vários mecanismos de convencimento, enfim me parece que Adorno e Horkheimer tinham razão ao perceber uma dialética negativa intrínseca ao desenvolvimento do sistema capitalista de produção.

Aspectos teóricos da Industria Cultural: teoria crítica

A industria cultural foi tema que inspirou os grandes teóricos da Escola de Frankfurt. Primeiramente os pensadores da primeira geração haviam mantido a confiança na razão crítica, que conseguiria se impor cedo ou tarde em acompanhamento ao progresso da humanidade. Adorno e Horkheimer (1985, p.20) acreditavam que, “apesar dos percalços e retrocessos, a humanidade chegaria, em última instância, a realizar a promessa humanística, contida na concepção kantiana da razão libertadora. A razão acabaria por realizar-se concomitantemente com a liberdade, a autonomia e o fim do reino da necessidade.” O objetivo do esclarecimento seria investir os homens na posição de senhores da própria vida, dissolvendo mitos e substituindo a imaginação pelo saber. Na visão de Adorno e Horkheimer, o saber, temperado pela razão crítica, seria a porta para o desenvolvimento da humanidade, que se libertaria dos mitos e primitivismos e daria vazão a todo o seu potencial de conhecimento.

Este pensamento veio ao fim quando governos totalitários emergiram no entre guerras, este acontecimento levou a repensar a crença na humanidade constituindo mecanismos de rever a razão como fonte do projeto iluminista e a perceber o seu uso instrumental, a partir de uma leitura weberiana. Este processo de desencantamento do mundo vivido pelos autores deu origem a um dos mais sólidos projetos da Escola de Frankfurt que foi a teoria crítica.

Desta forma, a razão, ao invés de conduzir à produção de um conhecimento que visasse à emancipação do espírito humano, levou a reprodução do consumo e o uso da ciência como expressão do poder político e militar. Essa razão instrumental, longe de libertar, tem caráter repressivo e ditatorial. A razão converte-se em uma razão alienada que se desviou do seu objetivo emancipatório original, transformando-se em seu contrário: a razão instrumental, o controle totalitário da natureza e a dominação incondicional dos homens.

Marcuse caminha no mesmo sentido ao avaliar em Ideologia da Sociedade Industrial, de 1964, que a ciência e a técnica não são apenas forças produtivas, mas funcionam como ideologia para legitimar o sistema. Para o autor os homens tornam-se cada vez mais submissos ao processo produtivo e, em nome dessa produtividade, recalcam outros aspectos da reflexão científica e existencial, “como a crítica do status quo e a emancipação dos homens do reino da necessidade”. Assim, ao invés de buscar a libertação da humanidade – seu objetivo original – a ciência trabalha para o capital e para a manutenção das relações de classe. Para Marcuse, um dos motivos para que a dimensão emancipadora ou crítica na produção de mercadorias tenha sido sufocada foi exatamente o fato de que a economia capitalista conseguiu satisfazer necessidades básicas das massas dos países desenvolvidos. Com algumas de suas reivindicações atendidas diminuiu a insatisfação e o ímpeto revolucionário dos indivíduos.

Para os autores da Escola de Frankfurt tudo que foi construído no capitalismo reforça o próprio sistema como a ideologia e o fetichismo. A produção cultural, particularmente, tem como objetivo construir os modelos de reprodução do capitalismo e dar atributos humanos nas mercadorias para reforçar o consumo.

Para Adorno, a cultura se transformou em valor de troca, assim como as demais mercadorias, a cultura só tem valor na medida em que pode ser trocada, não na medida em que é algo em si mesma. Adorno e Horkheimer (1985, p. 148) observa ainda que o novo não é o seu caráter mercantil que já existia na sociedade burguesa. A novidade é que hoje ela “se declara deliberadamente como tal, e é o fato de que a arte renega sua própria autonomia, incluindo-se orgulhosamente entre os bens de consumo, o que lhe confere o encanto da novidade”. Segundo este pensamento, o princípio do fetichismo da mercadoria se realiza completamente na Industria Cultural, “no qual o mundo sensível é substituído por uma seleção de imagens que existe acima dele, e que ao mesmo tempo se fez reconhecer como o sensível por excelência” (DEBORD, 1997, p.40).

A principal característica do desenvolvimento tecnológico, para os estudos da cultura, foi viabilizar o surgimento da Indústria Cultural e de todas as suas conseqüências. A principal delas é o reforço do sistema e da sociedade vigentes; a perda da aura da obra de arte descrita por Benjamin; o empobrecimento da experiência vivida; o abandono definitivo da luta de classes; a alienação dos consumidores. Também foi essa aproximação – ou a constatação de suas conseqüências - que provocou uma mudança radical na teoria crítica, que ficou mais dura, cética e pessimista.

Podemos dizer, a partir de uma primeira análise, que a Indústria Cultural é a forma “pela qual a produção artística e cultural é organizada no contexto das relações capitalistas de produção, lançada no mercado e por este consumida” (FREITAG, 1993, p.72). A grande questão é que, em seu domínio, a arte “deixa de ter o caráter único, singular, deixa de ser a expressão da genialidade, do sofrimento, da angústia de um produtor (artista, poeta, escritor) para ser um bem de consumo coletivo, destinado desde o início à venda, sendo avaliado segundo sua lucratividade ou aceitação de mercado e não pelo seu valor estético, filosófico, literário intrínseco” (Idem, p.72).

Dos vários desdobramentos da Industria Cultural, o cinema teve um papel de destaque nas obras de Benjamin, no qual era possível reproduzir uma cena, massificar o produto cultural e retirar a sua áurea na apresentação artística. No entanto, foi com a televisão que se levou aos lares o mais perfeito produto da industria cultural, o projeto quase acabado, onde o sistema capitalista, através da ideologia e do fetichismo, reproduz a própria estrutura da produção ao fortalecer o mercado de consumo e massificação. No Brasil o fortalecimento da televisão levou a algumas conseqüências na produção cultural e na disseminação de valores para terminar o projeto capitalista com o fim da resistência nas artes. Este processo tem como marco a década de 1970, onde vivíamos um período de repressão.

A televisão como consolidação da Industria Cultural no cenário brasileiro

Foi com os militares que tivemos um amplo avanço da industria cultural no Brasil (ALMEIDA e GUTIERREZ, 2005), através da incorporação e importação de todo o aparato tecnológico ligado às artes audiovisuais, principalmente a televisão. Esta é claro, já existia há algum tempo no país, a novidade daquela época era seu poder e alcance, em grande parte determinada por sua organização verdadeiramente moderna e pelo irrestrito apoio estatal a seu crescimento que, de tão intenso, chegou a provocar profundo impacto tanto no modo de ser da experiência cultural – afetando, em alguns casos, o destino de obras de outros gêneros (teatro, artes plásticas, músicas, poesia) –, quanto na própria situação material do produtor de cultura.

No teatro, na música e na poesia a arte audiovisual se fazia presente, com textos fotográficos, dinâmicos e urbanos, com sons que descreviam histórias, fatos e acontecimentos em imagens, com peças que esboçavam o fascínio, as cores e o Brasil. A televisão influenciou todo o ramo artístico, era o novo meio de comunicação, com uma abrangência assustadora, levando à incorporação de artistas e técnicos que viam na televisão uma nova estética, um novo meio de fazer arte. Um novo meio de reprodutibilidade técnica, já que não necessitava mais do palco para fazer teatro, existia agora a reprodução das imagens em forma de tela.

A industria cultural através da televisão incorporou a arte nacional-popular. O mercado introduziu na sua programação as expressões nacionais-populares – poesia marginal, cinema novo, teatro do oprimido, Centro Popular de Cultura, UNE-volante, tropicália – e transformou-as, através do processo de colonização – num mercado de consumo ligado ao nacionalismo e desenvolvimentismo com propagandas governamentais. O exemplo clássico deste nacionalismo sem engajamento, juntamente com o afastamento da estética e a desistência de algo inovador foram as novelas.

Neste processo de industrialização todos os mecanismos são transformados em mercadorias, a emancipação feminina, a liberdade sexual, todos estes discursos nascidos dos artistas de esquerda perderam o seu caráter subversivo na era da industria cultural. Esse aproveitamento conservador do sexo pelo mercado coexiste com o velho conservadorismo a glorificar a tradição, família e propriedade. Vivendo as tradições do passado e a apologia da liberação sexual nas telenovelas (RIDENTI, 1999, p.238).

Estes são motivos suficientes para demonstrar a força e a importância da televisão no Brasil. As novelas foram a grande invenção nacional. Capazes de prender mais de 70% dos telespectadores, com seu linguajar cotidiano, temas da vida privada e unicidade cultural. As novelas propiciaram tal conjunção com o público que as mulheres aprenderam a se vestir como os personagens e as adolescentes aprenderam a querer seus sonhos modernos. Segundo Kornis (2001, p.11) em 1964, quando a história da televisão brasileira começaria, o Brasil tinha 34 estações de TV e 1,8 milhão de aparelhos receptores. Em 1978, já eram 15 milhões de receptores. Em 1987, 31 milhões de televisores se espalhavam pelo País, dos quais 12,5 milhões em cores. Hoje, trata-se do sexto maior parque de receptores instalados no mundo.

Depois de 1980, quando se inicia o processo de redemocratização, segundo Ridenti (1999), há uma ampliação dos bens culturais industrializados, pois se há o fortalecimento da industria cultural com os militares é no período de abertura política que ela chega ao seu apogeu. Sem a censura os filmes, livros e programas nacionais e internacionais tiveram a possibilidade de serem divulgados amplamente. Com a abertura política ficou mais fácil a penetração dos bens culturais de massa a serem lançados e consumidos pela população.

A abertura política, no começo da década de 1980, propiciou um desenvolvimento vertiginoso da industria cultural, em função principalmente dos investimentos que já tinham sido realizados durante o regime militar na área das comunicações, sempre sob controle dos órgãos de censura. Porém, é preciso ter presente que enquanto a expressão típica da industria cultural no regime militar caracterizou-se pelo nacional-desenvolvimentismo, a industria cultural na redemocratização e nos períodos subseqüentes foi marcada pela globalização e pelo fim da censura. Estes dois acontecimentos mostraram ser o casamento perfeito para o desenvolvimento da Industria Cultural brasileira, tendo como carro chefe a televisão.

Conclusão

A industria cultural reflete uma necessidade do capitalismo de coisificar o mundo ao seu redor. Coisifica o homem transformando-o em mercadoria, e ao coisificar o homem transforma todo o produto do trabalho humano em algo a ser comprado. Com a cultura não aconteceu diferente, ela foi transformada em algo a ser vendida. A televisão como projeto tecnológico do capitalismo promoveu a reprodutibilidade técnica da arte e ao mesmo tempo trouxe para si a função de sedimentar a ideologia e o fetichismo da mercadoria. A televisão, em última análise, representa o projeto perfeito da reprodução do sistema capitalista de produção, e, no Brasil, podemos dizer que através da ligação com os militares e sua necessidade de conter os avanços da arte questionadora que sedimentou a arte vendável e a produção comercial em detrimento da arte de contestação e transformação.

Referências bibliográficas

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